segunda-feira

A POLUIÇÃO E OS CABELOS

Cortar os cabelos, ou ter seus cabelos cortados: eis a forma de poluição ambiental mais ignorada pela comunidade científica e população em geral.
Quando vemos um ralo ou pia entupidos por um emaranhado de cabelos, logo pensamos na sujeira que aquilo providencia: "que nojo"! Mas eu vou além, classificando a sujeira neste caso como a mais pura e sórdida forma de poluição doméstica a que temos contato!
Dizem que os cabelos são feitos de queratina, ou quitina, não sei ao certo, mas algumas daquelas proteínas de formação do corpo. As proteínas se renovam na natureza, por meio dos decompositores, ocasionando o equilíbrio do ecossistema, coisa e tal. Mas nada como esses bichinhos honestos serem engandos ao decomporem produtos químicos estranhos e transgênicos que vêm no pacote dos ralos, pensando se tratar da boa e velha quitina/ queratina; justo eles que nunca ouviram falar de Avon, Revlon etc etc. Injustiça!
Mas nos cabelos atuais há mais coisas do que o olho vê. Vejamos: um cabelo feminino apresenta mais variedade de produtos químicos do que uma pequena usina nuclear asiática em expansão; a paranóia dos cosméticos é tão extraordinária que move indiscriminadamente uma das maiores indústrias do mundo, a indústria de beleza. E sua matéria prima não poderia ser menos megalomaníaca, movimentando florestas e produtos animais de todos os tipos em todos os locais do globo!
Ainda há que se considerar que uma mulher com cabelos detonados, urgentes para o corte, apresenta quase sempre uma mistura apocalíptica de produtos já não funcionais, o que justifica sua ida ao salão de beleza. Além disso, com a inclusão dos homens metrossexuais no mercado, novos parâmetros alquímicos foram traçados, aumentando ainda mais a demanda por produtos e novas fórmulas. Dessa forma, a degradação da natureza ocorre também por meio da infestação de ralos e lixos com cabelos velhos, depositários de produtos de beleza altamente tóxicos!
E ninguém abre a boca para denunciar a prática, porque mulheres com cabelos bonitos são plenamente aceitas na sociedade, ao passo que homens com cabelos relativamente bem cuidados são satisfatoriamente aceitos pelas mulheres de cabelos bonitos, que por fim são o objeto de desejo desses e mais outros tantos homens.
A roda gira, gira, e Gaia reclama. Afinal, quem gosta de tomar sulfato de bário na cabeça, senão o infeliz ser humano, popstar da Natureza?
Ode Aleatos.

sexta-feira

A VIDA SOCIAL DOS CÃES E HOMENS

São Paulo explode-se em cães de todo tipo: pequenos, médios, gigantes, de porcelana, de pêlos, de casaco...um grande sucesso de vendas, seja para o pet shop, seja para a indústria de sabonetes!
Os cães tornaram-se uma referência social, econômica e ideológica. O passeio com os cães, um hábito; o seu uso para diversos fins pessoais, uma constante.
Numa cidade perdida em desaforos cosmopolitas e desumanidade negocial, os cães tomaram as funções de congregadores sociais. Através de sua simpatia e beleza, os simpáticos animaizinhos fazem-nos conversar na rua, sermos gentis, praticarmos gestos fraternais.
Tudo isso seria belo, não fosse o modo errado como se faz.
Sendo os cães companheiros e co-adictos dos humanos, eles deveriam servir de auxílio para o contato entre as pessoas; no entanto, eles são os próprios sujeitos desse contato, reservando-nos apenas a posição coadjuvante. Afinal, quem como eu não sofreu o desprazer de ter seu cão agraciado e cumprimentado na rua, enquanto você passa formalmente despercebido? São raras as vezes em que os transeuntes que alegram-se com seu cãozinho lhe dirigem o olhar, o sorriso, a palavra. Os cães são o centro único das atenções, e exclusivo.
A culpa não é dos cães. Nem dos pet shops. A culpa é dos modos de viver da ansiedade paulistana, com pílulas de convívio opondo-se ao massacre dos compromissos, do individualismo. Será que trabalhamos demais? Ou apenas temos medo de falar com o próximo?
Talvez hoje em dia seja “correto” dialogar com pessoas desconhecidas apenas se o lugar ou oportunidade são convenientes: negócios, informações, baladas, palestras...Impessoalidade e interesse. Apenas.
Ode Aleatos.

quarta-feira

DEVANEIOS SOBRE O PLANO REAL

Não faz tanto tempo, é verdade. Mas lembrei daqueles estranhos dias, enquanto digredia em comparações psicodélicas com os dias de hoje....
Todos devem lembrar de 1994/ 1995, o auge do Plano Real, e a sensação de que o Brasil estava no rumo certo, de que tudo se resolveria, que estávamos crescendo como a China.
Frango barato, pagode e axé, bundas baratas, bill clinton, copa do mundo, eletrodomésticos....moeda equiparada ao dólar, modernidade neo-liberal, poucos escândalos, empregos formais e informais! Esse país tinha futuro.
E então, tudo deu errado. A casa da Maria Joana, vulgo “Brazil”, mostrou-se o quintal das especulações, e degringolou logo atrás da Argentina, salvando-se do caos total talvez por causa da força cosmopolita das preces negras, brancas e indígenas. O resto todo mundo lembra bem...
Bom, essa História recente provou a falência da vitória cantada, da resolução fácil de todos os problemas; da farsa institucional, enfim...
Depois disso, veio a antítese na figura da esperança logo desacreditada pela boa e velha denúncia de corrupção. Nada mais velho neste país!
Mas o que seria mais poético, em termos de drama social, do que um sonho vivido que se tornou mera farsa?
Belo...belo e quase lírico sonho de uma nação movida a samba...
Ode Aleatos

SOBRE O DESARMAMENTO

Gostaria muito de falar sobre aquelas questões deliciosamente obscuras desse referendo como “o que devo votar mesmo?”, “o que é sim e o que é não?”, “qual das sociedades secretas está por trás disso tudo?”, “seria esse um atalho banal para a Era de Aquárius?”, mas o prezado leitor pode encontrar essas discussões na Folha de SP, o Estado de SP, a Veja, a Isto É, e todas as mídias megalomaníacas desta semana. Prefiro partir de outro ponto de partida, o enfoque dos “excluídos da mídia”!
Nisso, um amigo e leitor, favorável ao desarmamento, justificou sua posição pelo seguinte depoimento:
“Sinto uma energia de renovação no ar, de mudança, de contestação! Essa coisa de CPI, de cassações, do Maluf preso, mostra cada vez mais o povo querendo botar o governo nos eixos! É a esperança que se cria das cinzas do país-promessa, do Brasil-amado! Ah, o referendo...Sou contra...arma pra mim é uma coisa estúpida, é uma justificativa para homens animalescos que não pensam muito em família, paz, harmonia, yoga, vegan...Sobre os ladrões? Bom, eu nunca fui roubado, mas temos que entender os criminosos como pessoas sensíveis porém desorientadas, que s...”
Isso resume seu depoimento, qualificado como oblíquo por este Editor. Já outro colega, que não é leitor de Lecospirose porque não tem Internet em casa, deu sua justificativa para o não-desarmamento a seguir:
“O negócio é sair atirando em vagabundo, cabeludo e lésbica -em bicha já é dito popular. Arma é coisa pra macho, pra cara que se garante e tem que salvar sua família. Porque hoje em dia esses tipinhos aí da rua estão ligados à bandidagem, e se você vacilar, um marginal desses detona suas coisas e sua família. E essa história do governo tendo o monopólio da segurança, coisa e tal, isso é lorota, porque o Lula só fica lá fazendo m...”.
Também resumimos o depoimento descontrolado do nosso colega, porque as ofensas já estavam pulando babas afora- conseqüências da raiva.
Bom, talvez os relatos ajudem você a se decidir. Se sim, se não, se não vai ser sim, se sim será não, se o não servirá para um eventual sim social, ou se o não criará um sim em cadeia que resultará num imenso revertério apócrifo suficientemente muruxaba...
Eu? Prefiro o talvez. Já que o referendo só servirá para praticarmos um pouco de democracia (agora no seu aspecto menos pop) nesses tempos de dúvida sobre o sistema, o governo, e tudo mais.
Ode Aleatos.

sábado

VIVEMOS PARA AMAR?

É a pergunta que se faz à cabeça, graciosa ou agressivamente, dependendo da atual presença ou ausência do(a) amante, respectivamente (ou não). A cabeça não responde suficientemente bem, como sempre, e procuramos as respostas com amigos, conselheiros, mestres sábios ou livros de auto-ajuda (cito-os em nome da democracia). Nenhum deles responde. E você vasculha os conceitos filológico, panteísta, tarantinesco (além daqueles tradicionais) de "amor". As dificuldades teóricas aumentam, e você se pergunta: "onde vou passar a virada de Ano?". Não fuja, não se desespere, porque achei uma teoria bem interessante, do nosso querido cientista social Woody Allen, que vai lhe ajudar muito. Acompanhe seu raciocínio lógico e silogístico a seguir:
"Amar é sofrer. Para evitar o sofrimento, não se pode amar. Mas então sofre-se de não amar. Portanto, amar é sofrer, e não amar é sofrer, daí que sofrer é sofrer. Por outro lado, ser feliz é amar. Para ser feliz, então, deve-se sofrer. Mas o sofrimento torna-nos infelizes. Portanto, para ser infeliz deve-se amar, ou amar para sofrer, ou sofrer de tanta felicidade."
("Love and Death", 1974)
Confuso? Arrependido de ler? Convicto? Louco?
Escreva para me contar!
Ode Aleatos.

terça-feira

CENAS ESTRANHAS DENTRO DA MINA DE OURO

Ando apressado na rua. "Porque estou sempre apressado?". Olho duas, três, sete garotas realmente bonitas em questão de minutos, perambulando com roupas sérias de trabalho que tentam camuflar seu sex appeal. O sol bate nas minhas costas numa tentativa vã de secar o suor colante de pele e camisa. "Porque não estou de chinelos na praia?". O sapato aperta o dedo, que responde com proeminentes bolhas. Vejo pessoas chorando, rindo, sorrindo e simulando algum outro desejo, no grande carnaval de emoções humanas da avenida. Olho para o alto, sou surpreendido por outdoors e mil informações esparsas que pertubam meu subconsciente. "Malditos publicitários e sua semiótica!". Encontro casualmente um amigo. O ônibus interrompe um diálogo que não vingava. O bilhete Único come dez minutos restantes do prazo de validade, sem nenhuma explicação. "Deve ter dado pau no computador central...CTRL, ALT, DEL nele!". O sonho épico-pãodurista de cinco transportes em duas horas vai por água abaixo, ou melhor, catraca abaixo. Pessoas conversam calmamente no ônibus enquanto eu bafo de calor. "Estarei tão gordo assim?". Desço, ando, entro, saio, ando, volto, olho, reclamo e volto. Dessa vez, volto a andar. Menos apressado, mais suado. O sol continua. "Tende piedade de nós, ó magnífico Astro-Rei!". Continuo a andar, quando noto ao meu lado uma moto andado calmamente na calçada. Marcha lenta, pose confiante, trânsito na rua, espaço na calçada. Senti-me invadido no direito de pedestre. No direito de ir e vir, no direito à vida, e outras palavras bonitas da Constituição. Os homens-cocô, vulgos marronzinhos da CET, estavam tomando um cafezinho em algum boteco. Enquanto isso o motoboy desviava apenas dos casos mais prováveis de choque, como certas pessoas de costas, crianças correndo, cachorros com muleta etc. Quem vinha de frente a ele desviava como se este fosse um enorme homem gordo que ocupava um grande espaço na calçada, e nada mais. Quem estava ao lado olhava com repreensão, o que o motoboy respondia como todo bom motoqueiro, com folga e ameaças."Alguém tem uma Born to be Wild para o rapaz aqui ao lado?". Imaginei um 'autêntico' motoqueiro rico em sua Harley Davidson discutindo com ele: "Veja bem, rapaz, assim você queima o filme da nossa facção, fazendo besteiras na rua, coisa e tal"!. No final, ele pagaria uma cerveja e o motoboy contaria alguma lorota sobre este encontro para os amigos. Sol, mulheres arrogantes, pés doloridos, roupas de trabalho, pessoas, pessoas, trânsito, e motos na calçada. Uma combinação que bem poderia chamar "virado à paulista 2". Nisso, uma mulher de óculos desproporcionais me pergunta as horas. "Hora de ir embora, minha senhora!"
Ode Aleatos.

(Por sinal o título é uma homenagem ao The Doors, famosa banda de apoio do poeta contemporâneo, e vocalista nas horas vagas, Sr. Jim Morrison.)

sexta-feira

AS CORRERIAS E O SENTIDO DA VIDA

Pois é, essa semana demorei para escrever...Sabem como é, correria, compromissos, mil coisas, pouco tempo disponível para cerveja...Coisas da cidade grande.
"E nem deu tempo para pensar nas outras coisas..." QUE NADA! Quando acontece essa avalanche de coisas (in)úteis e (des)necessárias, você fica se perguntando o tempo todo "pra que?", "por que?", "aonde deixei minha chave?"...
É justamente quando os questionamentos sobre a vida, a morte, o universo e tudo mais, ganham mais côro. Pelo menos comigo...
Afinal, ficamos gastando tempo, energia, tutano e perfume com coisas irrisórias e quase sempre interesseiras (como empregos, relacionamentos e bens de consumo não-duráveis). Ironia macabra do sentido da vida!
E sobre a morte, ficam aqui os enunciados filosóficos do mestre Woody Allen:
"Muitos pensam que a morte é o fim, mas ela não é tão ruim assim...Ela é um bom método de diminuir suas despesas!"
("A última noite de Boris Gruschenko", 1974)
Ode Aleatos.

quinta-feira

UM MINUTO DE POESIA

Poema-pílula, rápido e fugaz!

Autor: Leco Peres...Protagonista: não necessariamente Leco Peres... Bom divertimento!

"Não sou liberal.
Não sou conservador.
Sou anarquista?
Prefiro alienado.

Não procuro conquistas e bens
minha meta é minha harmonia
não fantasio não crio ideologia
só vivo dia após dia.

Por isso mesmo, por ser eu mesmo
devo defender minha vida
lutar pelo "nada"
perpetuar essa ironia."

FIM
ODE ALEATOS.